Por EloInsights, com colaboração de Marcos Navarini
- A transformação exige governança para estabelecer mecanismos de apoio, monitoramento e reconhecimento de resultados.
- Na condução do processo, é preciso especial atenção para o engajamento e motivação das pessoas envolvidas na adoção de um novo status quo.
- Vamos analisar alguns erros que podem pulverizar o potencial das mudanças e como conceitos de change management ajudam a contorná-los.
Este é o segundo artigo de uma série de quatro publicações sobre as Grandes Batalhas da Transformação que serão publicados em EloInsights.
Em Batalhas da Transformação: como projetar o futuro, primeiro artigo da série, vimos como a formação de uma visão transformadora, capaz de guiar importantes mudanças organizacionais, começa pela projeção de futuro, alinhada a um propósito e a uma estratégia macro – com objetivos-chave a serem alcançados. Seguindo nosso framework, vamos nos concentrar agora nas fases de governança, que incluem a construção da narrativa da transformação, a condução em si do processo e a implementação de mecanismos de apoio e monitoramento.
Vamos recorrer aos conceitos de change management (gestão da mudança), que visam minimizar os impactos da transformação sobre os stakeholders ao reduzir barreiras, acelerando a assimilação de novas competências e a consolidação de um novo status quo, sempre em processo de renovação cíclica.
No desafio de preparação para a mudança e ao longo de toda a trajetória da organização nesse sentido, o maior risco é o de pulverizar o potencial da transformação. Por isso, é importante destacar algumas palavras-chave: engajamento, capacitação, reconhecimento e abandono do contexto prévio.
Lideranças próximas aos demais colaboradores engajam e motivam para vencer a resistência natural a mudanças, ao mesmo tempo em que é preciso promover a capacitação das pessoas e definir métricas de desempenho para monitoramento e consolidação dos novos processos. A gestão da mudança facilita todas essas tarefas ao longo de quatro principais etapas, segundo o framework usado pela EloGroup, derivado no modelo de Kurt Lewin: Planejar, Descongelar, Mudar e Recongelar. Descrevemos cada uma dessas etapas resumidamente a seguir:
Planejar: é a preparação, sempre guiada pelo propósito e com o mapeamento de quais processos e pessoas serão afetados. Definem-se também métricas para acompanhar resultados;
Descongelar: consiste em analisar e rever os padrões atuais da organização que precisam ser alterados. Envolve diretamente as pessoas da organização – que precisam se sentir incluídas e motivadas para assimilar os benefícios da transformação;
Mudar: corresponde ao processo em si, que envolve aprendizagem e capacitação, incluindo também o acompanhamento por parte dos stakeholders e de um processo de avaliação da transição;
Recongelar: a última etapa é a de solidificar o novo status quo e garantir o fechamento da implementação por meio da celebração de resultados, reconhecimento dos envolvidos e da formulação de estratégias para que não haja uma regressão ao contexto anterior.
Embora a metodologia descrita resolva grande parte das questões, vamos a seguir nos debruçar sobre alguns erros comuns que podem aparecer ao longo dessa segunda grande “batalha”, a etapa de governança e condução da transformação:
Erro 1: Criar uma narrativa pouco convincente sobre a transformação
Comunicar o propósito que vai guiar as mudanças de forma convincente e motivadora é um dos pontos focais para mobilizar uma coalizão, conquistando aliados para tornar todo o processo realidade. É a isso que se refere a narrativa da transformação. Também se relaciona a assegurar o buy-in dos stakeholders, ou seja, a participação ativa na adoção de novos modelos e dinâmicas. As falhas acontecem ao não se levar em conta cada público-alvo da organização. Algumas técnicas e caminhos podem mitigar esses problemas:
Mapear os stakeholders e empregar técnicas de storytelling direcionam ações para moldar a comunicação. Enquadrar diferentes perfis, avaliando posturas – de promotores, neutros ou detratores, por exemplo – é uma forma de personalizar e de comunicar a transformação de acordo com o público-alvo, transmitindo a mensagem a partir de histórias mais empáticas e humanas. Uma comunicação eficiente e convincente favorece o processo de identificação e de adesão do colaborador à mudança, pois ajuda a relacionar os objetivos da transformação com objetivos individuais e coletivos dos grupos afetados.
Definir critérios de sucesso dentro de um Plano de Engajamento é outro ponto importante, e deve ser feito por um método que considere o objetivo principal e os resultados-chave para monitorar a transformação. Outra ação efetiva é identificar em qual nível os stakeholders estão: se precisam descongelar e desapegar do modelo mais antigo; se estão em vias de aderir ao processo; se já estão envolvidos com a mudança; ou se avançaram para o recongelamento, ou seja, já incorporaram os novos modelos. A partir disso, é possível definir ações específicas e direcionadas – por exemplo, estruturando eventos e comunicação estratégica sobre a transformação para cada público mapeado.
Garantir o apoio da alta gerência, onde se concentram os patrocinadores, ou seja, as pessoas com conhecimento e poder de influência para acelerar a adesão. Criar uma coalizão específica de lideranças em torno dos objetivos estratégicos enaltece o processo de mudança. Quando há desinteresse ou conflito de prioridades, fruto do desalinhamento, perde-se credibilidade e potencial de transformação.
Erro 2: Não preparar e habilitar os stakeholders
Quando despreparadas, as pessoas podem se tornar uma barreira, ainda que se mostrem abertas ao processo desde o início. A gestão da mudança ganha tração ao disseminar as informações necessárias para a execução da transformação, minimizando ruídos e resistências. É possível promover o desenvolvimento de habilidades e o compartilhamento de conhecimentos por meio de algumas ações:
Organizar treinamentos, reskilling e avaliar a aprendizagem disponibilizando trilhas de conhecimento robustas, imprimindo transparência e compreensão sobre as novas funções e os processos que precisam ser adotados. Pode-se aproveitar canais de dúvidas e hubs de conteúdos já existentes. A aderência aos novos conceitos e à execução de novos modelos pode ser monitorada por meio de questionários, entrevistas e/ou checklists com os stakeholders. Isso garante a efetividade das ações e permite mensurar o timing da mudança antes de avançar etapas. É interessante cuidar do tom, o que será debatido a seguir.
De acordo com o behavioral design, o comportamento de um indivíduo ocorre pela interação entre motivação, habilidade e gatilho. Não basta disponibilizar conhecimento, pois existem diversos aspectos, até mesmo inconscientes, que interferem na tomada de decisão das pessoas.
Com uma visão transformadora bem estruturada e comunicada, é possível gerar motivação nos stakeholders. Capacitações, treinamentos e repositórios de conhecimento desenvolvem novas habilidades. Contudo, é importante ter em mente que a transformação é mudança de comportamento. E o comportamento depende do contexto que permeia a tomada de decisão. Dessa forma, ações que explorem os vieses cognitivos, aquelas decisões tomadas por nosso cérebro de forma “não pensada”, são capazes de gerar gatilhos (ou nudges) para disparar uma mudança de atitude.
O gráfico abaixo representa o modelo comportamental do especialista BJ Fogg e traduz essa interação:
Erro 3: Permitir que pequenos impedimentos travem a transformação
É comum e natural que surjam impedimentos num processo de transformação. Contudo, é de extrema importância poder recorrer a mecanismos de governança capazes de destravá-los e de manter um acompanhamento constante do status dos projetos. São ações desse tipo que vão dar cadência, ritmo e impulso à mudança:
Estabelecer a governança passa por definir papéis e responsabilidades para o acompanhamento da transformação: quem vai executar os ritos de gestão; quem precisa ser informado sobre determinados assuntos; quem vai fazer a gestão do portfólio de transformação, entre outras questões.
Adotar ritos de gestão e erguer estruturas organizacionais viabilizam a condução da transformação. Como já comentamos, a governança pode estar configurada em um Transformation Office (TO). Outros formatos possíveis são um Escritório de Projetos ou áreas de Inovação e Transformação Digital. O ponto central é obter uma coordenação transversal que zele pelo alinhamento estratégico e mantenha uma cadência regular e consistente de entregas. Agendas periódicas ajudam a mapear as principais barreiras, dando tração à jornada transformadora a partir do alinhamento de prioridades, da expectativa de diferentes times e da remoção de impedimentos.
Erro 4: Manter as pontes com a governança antiga
Para consolidar a transformação e torná-la perene é necessário empregar estratégias que eliminem o retorno ao contexto prévio, garantindo a transição entre modelos e processos. Transmitir confiança, reconhecer e celebrar os resultados gerados, além de comunicar com transparência o novo status quo, faz com que os stakeholders se sintam incluídos no processo e mais propensos a deixar velhos hábitos no passado.
Planejar a desativação de sistemas, processos e comportamentos prévios à transformação, através de um plano com atividades e prazos, é uma forma eficiente de suavizar a transição e dificultar o acesso ao que deve ficar no passado. É importante também comunicar os benefícios dos novos métodos, de forma que seja palpável para todos aqueles afetados.
Promover estratégias de reconhecimento com eventos, ou outro tipo de cerimônia que exalte indivíduos e stakeholders envolvidos na mudança, celebra e dá relevância às conquistas de resultados. A definição e o acompanhamento constante de métricas que demonstrem o sucesso das ações são maneiras de garantir que a adesão às mudanças esteja de fato acontecendo. Como falamos anteriormente, é preciso reforçar ações e disparar gatilhos para manter o engajamento. Fixar um canal para tirar dúvidas e oferecer o suporte necessário após novas implementações também são pontos fundamentais.
No próximo artigo, abordaremos a terceira grande batalha da transformação: como gerar valor e impacto.
MARCOS NAVARINI é consultor sênior e líder do Digital Lab da EloGroup.