“Inteligência artificial deve ser alavanca para solucionar desafios de negócio”

Por EloInsights

  • Sócio da EloGroup, Jaime Frenkel dá panorama do atual cenário de Venture Capital no Brasil e cita oportunidades em período de desaquecimento.  
  • Ele descreve como a capacidade de integrar diferentes veículos de inovação estratégica tem trazido vantagens importantes às empresas. 
  • Frenkel compartilha ainda sua visão sobre como investimentos em IA devem ser feitos a partir de uma perspectiva de alavanca para resolver desafios de negócio.

A inovação aberta, ou seja, o movimento das empresas em acessar o ecossistema de inovação, e startups, para conseguir ganhos estratégicos e retornos financeiros, é uma prática em constante evolução e amadurecimento ao longo dos últimos anos. E ela pode ser realizada de diversas maneiras. 

Uma dessas ferramentas é o Corporate Venture Capital (CVC), modalidade de investimento em que grandes empresas realizam aportes de capital em startups como forma de se expor a novas tecnologias sem um comprometimento tão grande como o de uma aquisição, por exemplo.  

Nesta entrevista, que teve como gancho a Pesquisa Corporate Venture Capital 2023 da Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (ABVCAP), o sócio da EloGroup Jaime Frenkel aborda vários dos tópicos que giram em torno desses temas.  

Ele fala sobre o atual momento do mercado de Venture Capital no Brasil, as oportunidades encontradas no desaquecimento pelo qual ele passa, além de tendências no uso de múltiplos veículos de inovação, e os melhores caminhos para incorporar competências de Inteligência Artificial dentro de uma organização, dada a atual corrida em torno desta tecnologia.   

Leia, a seguir, a entrevista na íntegra para EloInsights. 

Como você percebe o atual cenário de negócio de CVC no Brasil?

Nós passamos por um boom do mercado de Venture Capital de 2019 até 2022. Neste processo, o investimento no Brasil foi muito acelerado por players internacionais, que despejaram bilhões de dólares no mercado nacional. Isso criou um superaquecimento do mercado e uma “bolha”, em termos de valorização das empresas. 

Hoje, o que se vê é o desaquecimento deste cenário. As valuations diminuíram, os juros internacionais foram elevados e os players reduziram os seus investimentos no mundo inteiro – inclusive, no Brasil.  

No cenário nacional, também enfrentamos um aumento significativo nos valores dos juros, levando a uma menor disponibilidade de capital neste tipo de investimento. O resultado disso é um desaquecimento muito grande. 

Porém, como algumas empresas têm um “atraso” ocasionado pelos anos passados discutindo as oportunidades de fazer um VC, sem necessariamente fazer esse investimento, ainda existe um movimento considerável no mercado jogando esse jogo. Isso mantém a onda do Venture Capital para frente.  

Outro fator importante a ser considerado é que as empresas investem pensando não apenas no retorno financeiro, mas, também, visando um retorno estratégico. Isso permite ao negócio adquirir um olhar de longo prazo e com maior estabilidade.  

O Corporate Venture Capital para uma empresa é muito mais do que uma ferramenta de ganho financeiro; é também uma oportunidade de retorno estratégico. Com o CVC, passa a ser possível testar estratégias de maior incerteza e mais baixo comprometimento. Isso porque, muitas vezes, aparece como uma solução mais ágil e barata do que tentar implementar uma nova estratégia “dentro de casa”. 

A última edição da Pesquisa Corporate Venture Capital indicou que, em 2023, houve uma redução na quantidade de empresas que estão criando os seus CVCs. Mas é preciso considerar que a atuação hoje é muito mais forte do que há três anos. Embora esse número fosse maior, o mercado não contava com players tão maduros e presentes no ecossistema. 

Muita gente que entrou no CVC pelo F.o.M.O [“Fear of Missing Out”, o “Medo de Ficar de Fora”], sem saber muito o que estava fazendo, sem uma visão estratégica, acabou saindo. Então, restaram os players que de fato estão maduros, desenvolveram uma visão estratégica bem estabelecida e que vão guiar as próximas rodadas dos fundos. 

Você enxerga as empresas utilizando o CVC como uma ferramenta de transformação? Quais lentes são mais buscadas nesse processo? 

O CVC é uma ferramenta muito apropriada para conduzir testes antes de incorporar um novo modelo de negócio ao portfólio da empresa – isso é, “testar a água antes de pular”.  

Isso acontece com muitas empresas do agro, por exemplo, que têm como objetivo entrar no mundo digital. A técnica de agricultura de precisão, por exemplo, exige um grande domínio de tecnologia. Se você não tem essa expertise, o caminho pode ser investir em empresas que trabalham com soluções de drone e visão computacional para analisar a saúde da plantação, por exemplo, e, com base nisso, implementar algum processo de agricultura de precisão. 

O CVC como ferramenta de testes atende exatamente esses cenários em que há uma janela de oportunidade estratégica. Diante de uma condição de potencial de crescimento para a empresa, mas que exige dela capabilities muito diferentes das que ela apresenta, o CVC aparece como um destaque, por permitir, justamente, conduzir esses testes de uma maneira relativamente barata, em que você compra um pedaço da startup, e com agilidade. 

O que mais tem chamado a sua atenção em relação a pontos promissores em desenvolvimento e tendências que as empresas têm que ficar de olho?

Uma coisa que a gente tem visto as empresas fazerem – em especial, aquelas que entendemos como maduras e que são as que vão conseguir usar o CVC como ferramenta estratégica – é ter um portfólio de veículos para fazer inovação estratégica. 

Por exemplo, antes de fazer um investimento grande e adquirir uma nova área, a empresa quer testar a atuação dela com um pequeno investimento. O caminho nesses casos é fazer o CVC.  

Em outros casos, como em que a empresa quer acessar um tipo de solução, mas entende que a tecnologia não é suficientemente estratégica para ter um grande crescimento, o que pode ser feito é estabelecer uma relação com startups na contratação mais usual. 

Então, as empresas que conseguirem combinar esses veículos e, a partir da sua estratégia, entender qual a melhor combinação para utilizá-los, são as que vão conseguir navegar melhor e com mais agilidade para gerar transformação.

Como está a situação da Inteligência Artificial (IA) neste cenário? As empresas têm apresentado interesse em startups que desenvolvem soluções com esse tipo de ferramenta? 

Um ponto importante é que, se você não é uma empresa cujo “núcleo” é tecnologia, comprar uma empresa só pela capability de IA, porque tem pessoas e soluções especializadas ali dentro, pode não fazer muito sentido. Agora, usar IA como uma alavanca para resolver os desafios do seu negócio faz todo sentido.  

Então, o que importa é ter uma visão clara de quais são os principais casos de uso transformadores para o seu negócio que utilizam IA e usar esse entendimento para guiar os seus investimentos. 

Se você representa, por exemplo, uma empresa de nutrição especializada, pode buscar soluções de IA para melhorar a formulação dos produtos, discutir marketing digital ou aprimorar a relação com clientes pelo atendimento. Mas isso deve ser feito dentro de casos de uso concreto que estejam alinhados com o meu núcleo. 

Investir em IA só para poder falar que está envolvido com IA pode ser um problema. Você pode comprar uma empresa querendo adquirir essa capability, mas, no final do dia a conta não vai fechar.  

Como a EloGroup tem apoiado as empresas no desenvolvimento de suas estratégias de inovação? 

Há 17 anos, quando a EloGroup foi fundada, a palavra “startup” não era utilizada normalmente no mercado e “inovação aberta” era um termo que estava associado apenas à academia. Desde cedo, nós assumimos como grande compromisso andar próximos das discussões de fronteira e, hoje, nos conectamos muito bem com a inovação e a estratégia, até um ponto em que são elementos que convergem. 

A inovação passa a ser o componente da sua estratégia que olha para o seu negócio a partir do futuro, não das dores do presente. A gente consegue trazer muito bem essa visão, inclusive, a partir da interlocução com os C-levels. Isso ajuda a eliminar o F.o.M.O e criar uma visão, de fato, estratégica. 

Ao mesmo tempo, estamos também evoluindo muito na capacidade de combinar diferentes veículos de inovação. Isso passa por você criar uma governança que permita traduzir a estratégia em prioridades e, a partir desses objetivos prioritários, definir a operação dos veículos. Então, por exemplo, em venture building, nós estamos à frente de vários projetos de criação, prototipação e desenvolvimento de escala de novos negócios. 

Em CVC, nós ajudamos em toda a estratégia de estruturação dos fundos. Na EloGroup, não atuamos como gestores, mas apoiamos na busca, avaliação e prospecção das startups. Além disso, agimos nos planos de sinergia, acompanhando o processo de alinhamento dos investimentos com os negócios.  

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