Por EloInsights, com colaboração de Thiago Leite
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Realizar a jornada transformadora de uma organização, de maneira contínua, pode ser um desafio complexo, que se beneficia da implementação de um mecanismo de governança exclusivo.
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O Transformation Office oferece uma solução ao atingir diversas camadas gerenciais com uma estrutura permanente, central e com real poder transformacional.
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Neste artigo recorremos a arquétipos para explicar seu funcionamento e entrega de valor multidimensional, além de falarmos sobre os profissionais que tornam a adesão às mudanças mais orgânica, permanente e eficiente.
Tornar a transformação um processo contínuo dentro de uma organização é tão desafiador quanto indispensável para a sobrevivência do negócio. Envolve engajar e motivar pessoas, além de investir na construção de fundações baseadas em competências digitais, data intelligence, cultura de experimentação, aplicação de métodos ágeis em escala e exploração contínua de aprendizados. Para lidar com essas exigências, e melhorar a orquestração das soluções, a implementação de um Transformation Office pode ser importante.
O TO é um mecanismo de governança especializado, focado na transformação e no crescimento das organizações. Ele é formado por um conjunto de profissionais que têm o objetivo de ajudar a alta liderança, assim como os times nas pontas, a superar as barreiras dentro de um contexto de transformação organizacional.
Sua atuação vai além da busca por eficiência e do controle de custo, como ocorre em outras estruturas mais tradicionais. Por exemplo, uma de suas funções é garantir que a organização se mantenha conectada a um contexto mais amplo de mercado e indústria, fazendo um acompanhamento de tendências e direcionando a adoção de tecnologias aderentes aos desafios enfrentados pela empresa. O TO deve ter autonomia, aparecendo apartado da hierarquia corporativa, o que lhe permite levar outra perspectiva e assim auxiliar a alta liderança na jornada transformadora.
Ele é estruturado por diversos cargos de referência e estabelece um “modelo de atuação” para as demais áreas. Seu escopo é abrangente, podendo mobilizar times multifuncionais dentro das unidades de negócio – dando suporte aos executivos e mantendo-os informados – e oferecer maior consistência metodológica e ferramental a Business Cases.
Outra de suas funções é atrair talentos. Apoia a liderança na criação e revisão de políticas competitivas de atração e retenção de profissionais de nível sênior, os quais terão entre suas atribuições dar robustez ao cumprimento de indicadores-chave (KPIs). O Transformation Office também concebe e executa planos de comunicação no escopo de change management, minimizando resistências às mudanças e moldando a cultura corporativa.
Em suma, atua em múltiplas dimensões: direciona, governa, entrega impacto e contribui para a construção de competências fundacionais, que viabilizam a transformação como processo contínuo.
Os papéis dentro do Transformation Office
Para formar um time robusto, capaz de operacionalizar esse mecanismo de governança, é recomendável mesclar profissionais de fora com aqueles que já trabalham na empresa, em uma junção de quem já entende do negócio com quem pode agregar novas perspectivas. Ao longo do tempo, o quadro de colaboradores pode se diversificar em novas configurações.
Vejamos os distintos papéis, os perfis dos cargos a serem ocupados e de que maneira as funções se complementam na construção de um possível Transformation Office:
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Chief Transformation Officer: O cargo de nome diretamente ligado à estrutura de governança é ocupado por um profissional sênior que se reporta ao CEO. É um agente de mudança com habilidade de transpor resistências e obstáculos, possui entendimento transversal de áreas funcionais e unidades de negócio, além de ser um líder respeitado por toda a organização.
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Finance Lead: Coordena diferentes profissionais ligados a Finanças, integralmente dedicado e afastado de funções do dia a dia. Tem profundo conhecimento das regras de contabilidade e, no caso de organizações mais complexas, tem boa conexão com as diferentes lideranças da área financeira. Seu foco está em zelar pela transformação a partir de uma lente financeira, que envolve por exemplo a alocação de recursos em iniciativas transformadoras, as premissas e condições de financiamento das mesmas.
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HR Lead: Atuação voltada a construir políticas de atração de talentos da organização, modulando dinâmicas de trabalho, cultura corporativa, relações no trabalho e KPIs.
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Digital Lead: Profissional de TI com profundo conhecimento de arquitetura e de soluções digitais, dos sistemas corporativos e dos que são legados do negócio. Também se conecta com a rede de parceiros para pensar em soluções digitais do ecossistema, além de cultivar bom relacionamento com os líderes da organização.
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BU Senior Champion: Colaborador sênior, multifuncional e com bom trânsito entre as lideranças das unidades de negócio. É um líder respeitado pelos demais líderes e com habilidade comprovada em entregar programas de transformação complexos e aspiracionais.
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TO Leads: Profissionais com ampla experiência em gestão de projetos. Mantêm, em nível corporativo, o acompanhamento do conjunto de iniciativas transformadoras, reportando progresso e assegurando as integrações necessárias. São bem relacionados com as diversas áreas funcionais do negócio e vistos como talentos a serem lapidados.
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Delivery Squads: Times multifuncionais que aceleram a entrega de valor, compostos por profissionais considerados como talentos da organização. São dedicados ao desenvolvimento de alavancas críticas para o negócio, como novos modelos de operação e assets digitais.
As dimensões e os arquétipos de entrega de valor
O Transformation Office compartilha da mesma natureza multidimensional do processo de transformação, o que se reflete na entrega de valor. Com abordagem top-down, impacta uma variada gama de stakeholders, de conselheiros, a colaboradores e até mesmo clientes – tendo em vista que dita os rumos a serem tomados pela organização.
Dessa forma, promove uma constante troca de feedback e coleta inputs que nutrem os objetivos estratégicos, compondo um roadmap de iniciativas de real poder transformacional. Vamos, primeiramente, entender de que forma esse mecanismo opera em quatro principais dimensões:
- Direcionamento: zela pela orientação do processo de transformação. Conecta fatores internos – como desafios e oportunidades, maturidade de gestão e prontidão para mudança – a outros fatores externos, como tendências, tecnologias emergentes, projeção de futuro, visão sistêmica do mercado, da indústria e do posicionamento de concorrentes. Mantém o propósito como núcleo da transformação, aquilo que guia e motiva, além de entender quais aspectos serão alterados nessa jornada.
- Governança: A organização precisa de governança para um bom encaminhamento e acompanhamento da sua jornada transformadora. O Transformation Office pode trazer um reforço nesse sentido, na garantia da construção de uma narrativa, na comunicação ampla e constante de metas e objetivos, além de gerenciar conflitos de interesse que naturalmente surgem entre as áreas e pessoas impactadas. Sua entrega de valor também está no monitoramento e comunicação de resultados e ao ditar o ritmo e a cadência nas entregas.
- Entrega de impacto: é em cada uma das áreas funcionais e unidades de negócio que se realizam as iniciativas de transformação. Esse corpo central de governança acompanha o progresso e assegura a integração em todas as etapas das ações, da concepção de ideias até a implantação e escalabilidade de soluções. Isso se traduz em uma capacidade de acelerar a entrega de valor, seja desenvolvendo novos modelos de operação, direcionando o uso e aplicação de tecnologias, entre outras.
- Construção de fundações: refere-se à solidificação das bases do negócio, o que envolve manter em evolução o desenvolvimento de competências digitais, a aplicação de data intelligence, a adoção de uma cultura de experimentação, a aplicação de métodos ágeis em escala e a exploração contínua de aprendizados. A contribuição dessa unidade transformacional está em pensar soluções digitais de olho em todo o ecossistema. Administra levando em conta sistemas legados, ao mesmo tempo em que direciona investimentos em infraestrutura, arquitetura e na incorporação de novas tecnologias – tendo sempre em vista formas de agilizar mudanças, o cumprimento de objetivos estratégicos, o alinhamento à visão de futuro da organização – assim como a adaptação e antecipação de contextos disruptivos.
Para aprofundar o entendimento sobre como o Transformation Office entrega valor dentro de um processo de transformação, estabelecemos, a seguir, alguns arquétipos de atuação, além de um diagrama com a dinâmica entre cada um deles e as dimensões descritas acima.
Não quer dizer que todos esses modelos tomam forma ao mesmo tempo, tampouco que se resuma a apenas um deles. A evolução de sua implementação será debatida mais à frente.
Arquiteto Estratégico
Em conjunto com o Conselho Administrativo, o Transformation Office ordena, gerencia e checa regularmente a consistência das agendas de estratégia e de transformação, o que envolve manter a clareza da visão transformadora e das aspirações organizacionais com balanceamento do portfólio estratégico de ações, das ameaças e das oportunidades.
Torre de Controle
Já empoderado pelo CEO, distribui responsabilidades, ajustando as premissas, o prazo e as metas de execução das iniciativas. Modera também interdependências na priorização de pautas da transformação, mediando conflitos de interesse das diferentes áreas funcionais.
Rastreador
Aqui, o mecanismo de governança será o responsável por calcular ganhos, disponibilizar dashboards e métricas – como os KPIs (Key Performance Indicators) – que indicam o progresso, as barreiras e a captura do valor para o negócio. Suporta as tomadas de decisão não só das pontas, mas especialmente do CEO e do CFO.
Acelerador
Neste arquétipo, determina o tom, a cadência e o ritmo das iniciativas transformadoras. Também opera um conjunto específico de ações: horizontais, multifuncionais e complexas, que só podem ser realizadas de forma centralizada por um time dedicado e de alta performance, como no caso de uma reestruturação do modelo operacional, ou em decisões que envolvam assets digitais.
Coach
Dissemina novas mentalidades, comportamentos, além de providenciar ferramentas para uma condução ágil da transformação, focada no cliente, pautada por testagem e aprendizagem em ciclos curtos e regulares de experimentação para sedimentar a orientação às mudanças. Mantém comunicação bilateral com os stakeholders: ao mesmo tempo em que coleta feedbacks, produz inputs constantes que facilitam e direcionam todo o processo.
Facilitador
Acessa, direta e frequentemente, diferentes camadas executivas da organização, do CEO a outros membros da alta liderança. Destrava investimentos, financiamentos e aciona atores do ecossistema – incluindo fornecedores, startups, ente outros – para catalisar as mudanças.
Uma implementação gradual e evolutiva do Transformation Office
Não existe uma regra única para a implementação do Transformation Office, essa engrenagem que governa transformações. Contudo, quando se inicia esse processo do zero – e se o tipo de transformação desejado e o porte da organização têm alto grau de complexidade – existe um caminho habitual, que vamos descrever recorrendo aos arquétipos de entrega de valor:
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Até o final do primeiro ano: o Arquiteto Estratégico ganha corpo para julgar o que é mais relevante, garantindo as iniciativas que firmem o direcionamento da agenda transformadora.
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Entre o segundo e terceiro ano de implementação: com a consistência estratégica adquirida, o CTO cresce em responsabilidade, nos moldes da Torre de Controle e do Rastreador. As ações são voltadas a centralizar a governança e criar padrões para o nascimento e progresso de iniciativas transformadoras – as quais, inclusive, podem ser descontinuadas ao longo da jornada. Também são levadas ao centro aquelas iniciativas mais complexas, que demandam maior capacidade de execução e tendem a não progredir se ficarem distribuídas nas pontas.
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Do terceiro ano em diante: já maduro, o Transformation Office pode ativar novas entregas de valor. Molda sua gestão nos arquétipos Acelerador, Coach e Facilitador para catalisar processos, participar mais ativamente da disseminação de uma cultura orientada à mudança. Atua em todo ecossistema, acessando recursos, destravando financiamentos, firmando parcerias.
À medida que evolui e ganha maturidade, o Transformation Office não deixa de existir, mas pode redistribuir as funções ligadas à transformação para as unidades de negócios e áreas funcionais, conforme estas se desenvolvem e se capacitam. É por essa razão que a configuração do TO se modifica para assumir novos formatos, readaptando-se a diversas variáveis: ao senso de urgência para novas ações; ao direcionamento estratégico da corporação; à maturidade da organização em absorver mudanças; além das capabilities e dos recursos necessários para manter o ritmo das transformações.
O fato é que uma cultura orientada a mudanças exige governança consistente e centrada na estratégia organizacional. Também é imprescindível ter, ao mesmo tempo, alinhamento com o topo e a promoção de autonomia nas pontas, a fim de capilarizar e sedimentar a capacidade de tomada de decisões. O caminho para o sucesso está em tornar os processos de transformação mais orgânicos e cíclicos, mantendo a organização em evolução constante.
THIAGO LEITE é gerente sênior na EloGroup