Por Lucas De Vivo
- Em julho de 2025 foi lançado o 6° Estudo Anual de Prioridades dos CxOs, feito pela consultoria alemã Horváth.
- O foco do levantamento deste ano foi o novo direcionamento estratégico das empresas em meio a tensões internacionais e desafios macroeconômicos, enfatizando a maturidade das iniciativas de IA e a realocação de operações e força de trabalho.
- Lukas Struck, consultor de estratégia e transformação da Horváth, falou sobre o processo de construção do estudo e a visão da consultoria alemã a respeito dos resultados da pesquisa.
O cenário empresarial atual caracteriza-se por uma economia global cada vez mais fragmentada e por rápidas disrupções tecnológicas, com o avanço da Inteligência Artificial (IA) se tornando fundamental para o crescimento no mercado. Os executivos de alto nível (CxOs), portanto, se veem diante do desafio de lidar com incertezas e navegar por águas turbulentas, buscando manter, expandir e internacionalizar seus negócios.
O 6º Estudo Anual de Prioridades de CxOs, da consultoria alemã Horváth, oferece um mapa para entender e enfrentar essas dificuldades, revelando insights sobre a maturidade da IA e os esforços de sustentabilidade, além de como realocar a força de trabalho em uma economia global fragmentada.
Com mais de 1.000 líderes globais em 33 países (sendo 40% CEOs e 29% CFOs, aproximadamente), a pesquisa abrange os desafios macroeconômicos, o papel transformador da tecnologia (especialmente a Inteligência Artificial) e o impacto das iniciativas empresariais rumo a um comércio mais equilibrado mundialmente.
Intitulado “Fundamentos: A Nova Vantagem Estratégica – Navegando por Conflitos Comerciais e Disrupções Tecnológicas”, o documento reforça com clareza a importância de resgatar os fundamentos essenciais e tratá-los como um diferencial competitivo. Entre eles destacam-se a volta da priorização da força de trabalho (em busca de mais excelência operacional), o aprimoramento do portfólio de produtos e serviços e uma cadeia de valor equilibrada, considerados vantagens estratégicas para o sucesso.
Para não perder as oportunidades e acompanhar a evolução do mercado, é crucial compreender como integrar essas prioridades ao dia a dia da empresa. A ideia não pode ser mais sobreviver, e sim prosperar e superar a concorrência global.
Entrevistamos Lukas Struck, consultor de estratégia e transformação da Horváth, para explorar os principais achados da análise em torno da lucratividade, da maturidade digital e da reorganização estratégica das empresas.
Lucratividade e amadurecimento da transformação digital
Uma das conclusões centrais apresentadas pelo estudo é o compromisso efetivo dos CxOs em impulsionar a disciplina de lucro, sempre impulsionada pelo uso estratégico da tecnologia.
No caso das indústrias de fabricação, a melhoria das estruturas de custo e lucro é a principal prioridade, já que é necessário ganhar eficiência para lidar com a volatilidade do mercado. Nas indústrias de serviços a transformação digital se mostra novamente no topo da agenda, especialmente visando redução de custos.
Lukas Struck, consultor de estratégia e transformação da Horváth, reforça o foco nos portfólios e negócios centrais para ampliar a lucratividade e reduzir as despesas: “As empresas conhecem melhor seus mercados principais. Não é momento de diversificar produtos ou mercados, e sim de focar no que já é consolidado.”
O levantamento ressalta ainda um amadurecimento na narrativa da transformação digital: a fase de experimentação agora dá lugar, crescentemente, à pressão para comprovar a criação de valor a partir dos investimentos em IA, entre outras tecnologias. “É importante, aqui, entender a diferença entre investimento e inovação efetiva”, diz Struck. Para ele, não se trata apenas de dinheiro, e sim da mentalidade certa. “É necessário ter uma boa equipe de liderança por trás das mudanças, uma boa gestão ao final. Além do lado técnico, há a força de trabalho humana.”
Reorganizar estruturas e processos também passa a ser uma necessidade, em busca de maior agilidade e resiliência. “Todos estão reorganizando suas empresas, voltando-se a tópicos de pessoas. Estão buscando equipes e estruturas mais eficientes, além de, infelizmente, fazer alguns cortes de pessoal para reforçar a prioridade mais alta: melhorias nas disciplinas de custo e lucro”, explica Lukas.
Os executivos, no momento, priorizam iniciativas de retorno imediato para combater as incertezas e pressões de custos.
O impacto estratégico da IA: maturidade, investimento e aumento da produtividade
Muitas empresas ainda estão nos estágios iniciais da adoção de IA em seus processos. Segundo Struck, é importante entender o que realmente é um processo de IA: “Comprar licenças para ChatGPT ou outras ferramentas não é exatamente iniciar um processo de IA. Do começo aos casos de uso há uma lacuna evidente.”
De acordo com o documento, mais de 30% das empresas ainda não chegaram a uma abordagem minimamente estruturada do uso da IA em suas operações, e os processos administrativos são os que se mostram mais estacionados, com 43% das empresas ainda na fase inicial da maturidade.
Apesar desse cenário, os investimentos em IA crescem exponencialmente, direcionados principalmente para ganhos mensuráveis de produtividade em TI, digitalização e operações. “A maioria das empresas está somente começando”, explica Lukas. “Elas esperam aumentar sua produtividade do trabalho com IA em diversos tópicos nos próximos anos, mas ainda não conseguiram encontrar seus casos de uso. É um longo caminho a percorrer.”
Ainda há, entretanto, áreas que exploram pouco o potencial da IA, como as de comunicação e serviços ao cliente, oferta de produtos e serviços e a tomada de decisões gerenciais. Para este último, 40% das empresas ainda nem iniciaram a jornada.
Embora as indústrias de serviços liderem o investimento, as indústrias de fabricação mostram forte impulso nos gastos com IA, sendo a automotiva a mais expressiva, com um aumento de 48% nos investimentos em relação a 2024.
“No setor automotivo há um planejamento para o aumento de receita e desenvolvimento de renda, mas ainda assim o desenvolvimento da força de trabalho diminui”, explica Lukas. “São tópicos que provavelmente andam de mãos dadas, e eles estão aumentando seus gastos com IA para ter a esperança de poder cortar custos com pessoal de outro lado.”
Há uma redução dos investimentos em áreas como bens de consumo e transporte, viagem e logística. Isso indica, segundo a pesquisa, mudanças na prioridade de orçamento ou até mesmo algum atraso ao escalar iniciativas de IA além das fases iniciais.
Realocação estratégica e otimização de receitas em uma economia fragmentada
Diante da fragmentação da economia global e das crescentes tensões comerciais (como as tarifas e restrições à exportação), a presença global das empresas é cada vez mais repensada e redesenhada.
O cenário exige otimização de custos e menor dependência de mercados externos, com todos os setores buscando uma redução de custo de 3% em relação à receita. Entre as mudanças priorizadas nesse redesenho estão os gastos com SG&A (Selling, General, and Administrative) e materiais (no caso das indústrias de fabricação) e com despesas relacionadas a pessoal (nas indústrias de serviços).
O crescimento da receita e a reorganização otimizada dos custos são assuntos equilibrados nas discussões de conselho, e cada vez mais o aumento da receita é impulsionado pelo volume, e não pelos preços, o que mostra certa sensibilidade aos valores e à concorrência intensificada, além da dificuldade, devido à necessidade de garantir o relacionamento, de repassar o aumento dos custos para o consumidor.
A realocação de investimentos também ganha lugar na pauta, com a Índia sendo o principal destino para a força de trabalho, e a Europa um dos mais procurados para o CAPEX. Dois terços do total de investimentos é direcionado ao continente europeu, com um aumento programado de aproximadamente 7% ano a ano nos próximos cinco anos.
“As empresas na região DACH (Áustria, Suíça, Alemanha) mudaram seus planos para, por exemplo, leste e sul da Europa, tanto em termos de força de trabalho quanto de CAPEX”, afirma Lukas. Ele ainda detalha que a disponibilidade de talentos é crucial para essas realocações: “Muitos jovens profissionais, com boa educação, estão entrando no mercado como força de trabalho. Isso é uma vantagem estratégica em países de baixo custo, com horas de trabalho não tão caras.”
Compromisso com as metas de zero emissão líquida (net-zero) e incertezas sobre sustentabilidade
Ainda que haja incertezas externas e uma crescente pressão por custos, a maioria das empresas respondentes permanece com um compromisso firme em relação às suas metas de zero emissões líquidas. Isso evidencia que, apesar de não estar mais entre as grandes prioridades, o cuidado com a sustentabilidade ainda é parte essencial de um planejamento estratégico.
70% das organizações, de acordo com a amostragem, seguem comprometidas com o net-zero, e algumas inclusive planejam acelerar seus esforços, aplicando a sustentabilidade como um diferencial competitivo.
“O planejamento e o processo já foram estabelecidos. As empresas estão passando por isso com sua meta em mente e com objetivos já planejados.”, afirma Struck.
Entretanto, ainda há os desafios de um contexto volátil: uma em cada cinco empresas considera adiar as metas, equilibrando de maneira pontual os objetivos de longo prazo e as demandas e resultados imediatos, o que faz com que o foco em sustentabilidade perca força em relação a 2024.
Segundo o consultor da Horváth, questões regulatórias influenciam fortemente nessa decisão: “As regulações também sofreram adiamentos, e as empresas não precisam mais fornecer certas declarações sobre tópicos relevantes de maneira pública tão cedo, se comparado aos anos anteriores”, explica. “Elas postergam suas metas por não serem forçadas a honrar compromissos relevantes naquele momento.”
No caso das indústrias de serviços há um comprometimento mais elevado, já que o setor manufatureiro tem maior intensidade de emissões e, consequentemente, uma complexidade maior de transição.
Apesar de reforçar que os resultados de longo prazo relacionados aos esforços sustentáveis são mais difíceis de medir e contrários à ideia de imediatismo atual, Lukas menciona a importância do tema da sustentabilidade para a Horváth e para o mercado em si: “Nós, na Horváth, não estamos simplesmente deixando de lado o tema e esperando para ver o que acontece. Temos clientes e projetos focados nesse tópico”, reitera.
“É importante lembrar que uma empresa vista como sustentável se torna mais atraente para novos trabalhadores e para o mercado externo. A imagem de “empresa verde” contribui para o employer branding e para a reputação.”
Conclusão
Em um cenário global marcado por tensões comerciais, instabilidade econômica e transformações tecnológicas aceleradas, o 6° Estudo Anual de Prioridades dos CxOs da Horváth traz à tona as principais iniciativas dos executivos a fim de resgatar e fortalecer os fundamentos estratégicos das organizações.
A busca por excelência operacional, aliada à priorização dos negócios centrais e à disciplina de lucro, surge como uma resposta à crescente pressão por eficiência. As medidas de impacto imediato, que envolvem reestruturações internas e cortes de custo, estão em alta, e o foco na produtividade orienta a maior parte da tomada de decisão.
Com o avanço da IA, a transformação digital deixa a fase de experimentação e se consolida como ferramenta central para ampliar a eficiência. A IA, por sua vez, representa uma das principais apostas quando o assunto é o aumento da produtividade. Os investimentos crescem, mas a maturidade ainda é algo questionável diante de empresas que buscam definir casos claros de uso e estratégias estruturadas para a adoção desses modelos.
A sustentabilidade, por sua vez, ainda é um pilar relevante na estratégia empresarial, mas vê alguns esforços a seu favor adiados em prol das iniciativas de retorno imediato.
Por fim, prosperar em meio à fragmentação global requer, principalmente, a integração equilibrada entre lucratividade, precisão na movimentação da força de trabalho, adoções de novas tecnologias e o impacto socioambiental dessas decisões.
LUCAS DE VIVO é Redator de EloInsights