Por EloInsights
- Thiago Leite, sócio da EloGroup, compartilha insights sobre tendências da Transformação observadas em grandes companhias de diferentes setores da economia.
- Leite fala, por exemplo, sobre as diferentes abordagens em torno da aplicação das lentes de dados, Advanced Analytics e Inteligência Artificial, e sobre a importância do uso dessas alavancas em projetos fundacionais capazes de se converterem em alto valor para as organizações.
- Ele discute ainda a dependência, muitas vezes encontrada na indústria, de parceiros para viabilizar a transformação, quando o assunto é a aplicação de lentes digitais, e como essa dependência pode ser mitigada a partir de programas de aculturamento.
Quais são os passos fundamentais de uma Transformação bem-sucedida? Como garantir que a agenda da transformação dentro de uma organização esteja alinhada à estratégia maior da empresa, e assegurar assim a sustentabilidade do movimento transformacional?
Esses são alguns dos tópicos abordados por Thiago Leite, sócio da EloGroup, nesta entrevista para EloInsights.
Leite revela insights importantes obtidos a partir de projetos de Transformação Digital realizados pela EloGroup em grandes organizações em setores como o de serviços, celulose e papel, e siderúrgico. Ele fala, por exemplo, sobre as diferentes abordagens em torno da aplicação das lentes de dados, Advanced Analytics e Inteligência Artificial, e sobre a importância do uso dessas alavancas em projetos fundacionais capazes de se converterem em alto valor para as organizações.
Ele discute ainda a dependência, muitas vezes encontrada na indústria, de parceiros para viabilizar a transformação, quando o assunto é a aplicação de lentes digitais, e como essa dependência pode ser mitigada a partir de programas de aculturamento.
“Não basta apenas o investimento [em tecnologia e engenharia de dados]”, diz Leite em um trecho da conversa. “O aculturamento dos times precisa acompanhar esse processo para construir as fundações.”
Confira a seguir a íntegra da entrevista com Thiago Leite, repleta de insights importantes para qualquer liderança:
O que você vê como prioridade nas empresas hoje em termos de Transformação?
A aceleração digital tem sido uma grande prioridade para as empresas. Vivemos num contexto no qual a experiência do cliente tem sido cada vez mais valorizada e as empresas buscam mais eficiência. Dessa forma, o digital se tornou uma agenda comum há alguns anos. Quem já teve essa entrada no digital quer obter mais ganhos, enquanto quem ainda não o fez, por letargia do mercado ou postergando investimentos, está correndo atrás. Isso tanto para empresas já consolidadas no mercado quanto para as nativas digitais.
Quais os principais desafios que você enxerga nas organizações em relação a governança de Transformação?
O primeiro grande desafio é pensar como financiar, em termos amplos, a transformação, visto que ela só fica de pé mediante alguns fatores, como senso de urgência e a existência de uma agenda estratégica clara que direcione qual a natureza dessas iniciativas (eficiência, geração de receita, experiência do cliente etc). Assim, garante-se que os projetos desenvolvidos terão um retorno para o negócio e que a transformação seja trabalhada de forma contínua.
O mercado exige que as empresas se transformem o tempo todo. Então, esse processo não pode estar limitado a um único momento do tempo. A própria natureza dessas transformações é diferente. Às vezes, é necessário um reposicionamento digital. Em outras ocasiões, o objetivo é uma reposição de produtos e serviços, por exemplo.
Quando falamos em Transformação Digital, quais alavancas e lentes têm sido priorizadas nas empresas?
Existe hoje uma preocupação muito grande em aumentar a escalabilidade da força de trabalho das organizações. Isto é, transformar a capacidade existente para que ela consiga ser mais produtiva e dê conta do recado, ainda que a organização passe por algum crescimento que redundará aumento de demanda de trabalho.
Isso envolve, por exemplo, estruturar corretamente o processo (“no process, no data, no automation”), a automação de processos, e fluxos de comunicação entre áreas, reduzindo fricção e retrabalho. Esta, por sua vez, demandará a utilização de Agentes de IA para coletar, organizar, agrupar e executar ações potencializadas pelo uso da IA Generativa. O desenvolvimento de autosserviços para clientes externos e internos é uma segunda alavanca relevante.
Principalmente no setor industrial, de produção e manufatura, uma terceira alavanca da Transformação Digital tem sido o aumento da produtividade da capacidade instalada, que envolve tirar o máximo das unidades fabris e ativos existentes por meio da expansão de sensores e coleta de dados e estruturação de núcleos de inteligência para gestão de ativos e processos para alavancar a capacidade de pessoas e áreas e atuar transversalmente na redução de custos de manutenção e produtividade dos ativos.
Como você enxerga a evolução da Transformação Digital especificamente dentro da indústria nos últimos anos?
O tema da Indústria 4.0 realmente avançou. O nível de desconhecimento sobre o tema, por exemplo, reduziu bastante. Após um “vale desilusão”, provocado por iniciativas com grande apetite e pouco foco, hoje percebo um equilíbrio maior entre os investimentos feitos dentro das empresas e o retorno efetivo desses projetos.
Na EloGroup, conduzimos com nossos clientes diversos projetos extremamente relevantes nesse tema. E a experiência revelou que esse mercado exige a condução de projetos com um caráter de autofinanciamento.
Costumamos dizer que Transformação Digital é como um ecossistema marinho. Passou a imperar uma estratégia de “projetos tubarões” (poucas iniciativas de alto impacto) em detrimento de “cardumes” (múltiplos projetos pouco transformacionais). O ideal é formar um ecossistema equilibrado de projetos “corais”, que equilibram os projetos grandes e transformacionais com projetos menores e descentralizados nas áreas, que financiam projetos habilitadores capazes de estabelecer a fundação de dados e tecnologia (data lakes, por exemplo).
Percebo também que o aculturamento da liderança da indústria no tema aumentou, e isso redunda em demandas mais claras, parcerias mais sólidas e jornadas mais perenes.
Dentro de uma siderúrgica que atendemos, por exemplo, fomos capazes de eleger um problema muito relevante para a organização e suas variantes, e focamos nele toda a nossa energia com impacto sensível na principal métrica de produtividade da indústria. Por meio da utilização da lente dos dados e Advanced Analytics, encapsulados numa solução tecnológica integrada de planejamento de suprimentos, conseguimos solucionar a questão e gerar um grande impacto.
Em outro exemplo, em uma empresa de papel e celulose, fizemos um esforço de harmonização que identificou cerca de 325 projetos relacionados a Transformação Digital. Desses, compreendemos que de cinco a dez seriam de fato muito impactantes. Foram justamente os escolhidos para se investir nas diversas unidades industriais da divisão de papéis utilizando-os como base para aculturar todo o time e liderança envolvida em como conduzir e governar a transformação para geração de resultados.
Então, nós percebemos que, em vez de adotar uma estratégia mais ampla e difusa de investimentos em hardware, sensores etc, poderia ser mais relevante focar em poucos e bons projetos, com grande impacto transformacional, reduzindo a pulverização e trabalhando melhor o aculturamento da base das pessoas dos níveis gerenciais e operacionais envolvidas nesses projetos.
Como você enxerga as empresas amadurecendo o seu olhar para o tratamento e utilização de dados?
Hoje, é possível ver no mercado dois movimentos distintos. Em um deles, as empresas investem muito na engenharia de dados para promover um ambiente de melhor consumo. Isso cria uma base para que a empresa comece a fazer projetos de visualização de dados e análise avançada.
Por falta de aculturamento dos times envolvidos e/ou governança para garantir priorização, geralmente os custos de nuvem vão para as alturas. Portanto, sem planejamento, o retorno vai ser longuíssimo e dificilmente será possível obter financiamento para futuras iniciativas fundacionais na organização.
Por outro lado, vemos também o movimento oposto acontecer. Isto é, uma preocupação inicial em aculturar as pessoas, suscitar os casos de uso importantes, que se desdobram no desenvolvimento de dashboards e modelos analíticos mais avançados, trazendo consigo a discussão da estruturação dos dados.
Nesse aspecto, apesar da evolução do tema Indústria 4.0, e olhando para desafios inclusive em países de economia bastante desenvolvida, nota-se que não é apenas o mercado brasileiro que encontra uma realidade em que existe pouca ou nenhuma estruturação dos dados utilizados no chão de fábrica, estes usados muitas vezes de forma limitada e tratados manualmente, sem que seja explorado seu completo potencial. Como regra geral, notamos que ainda há uma grande oportunidade de evolução.
Na EloGroup, tendemos mais à via do aculturamento e dos casos de uso que puxam a discussão de dados. É mais fácil justificar o financiamento dessa jornada quando você já tem casos práticos com retornos tangíveis.
A discussão da estruturação dos dados entra nesse “pacote”, financiado pelas oportunidades mapeadas. São justamente os casos de uso que vão ditar quais fontes devem ser então priorizadas na lente da engenharia de dados, compondo um “roadmap” de ingestão de dados que responda às necessidades da organização no tempo e evitando um aumento excessivo do custo de nuvem antes de haver captura clara de retornos com os projetos.
Como você vê, nesse mesmo contexto, a evolução do debate em torno da aplicação de Inteligência Artificial nas empresas?
Quando falamos em focar em um número menor de iniciativas com alto valor agregado, fatalmente essas iniciativas demandarão o uso inteligência artificial, pois o potencial de transformação geralmente está diretamente associado à aplicação de modelos avançados capazes de lidar com grandes volumes de dados. Ou seja, esse movimento de amadurecimento do mercado e das empresas, ancorado em projetos analíticos na indústria, tem a IA como um forte agente acelerador.
O que se percebe muitas vezes é que ainda há uma grande dependência das empresas em relação a terceiros para acelerar esse movimento – principalmente as indústrias. Em alguns negócios específicos, essa dependência se dá em relação aos próprios terceiros que provêm o maquinário ou que atuam como integradores das plantas. Vemos, portanto, uma necessidade importante das empresas em internalizar essa competência; até por isso a EloGroup desenvolveu uma oferta de aculturamento para responder a essa necessidade.
Naturalmente, outras alavancas passam a ser demandadas para acelerar ainda mais essa capacidade. Vem daí o crescimento no uso de ferramentas low-code para desenvolver automações. Temos percebido uma forte tendência de aplicação de ferramentas low-code para suportar o uso da inteligência artificial na indústria. Já surgem plataformas que aceleram isso, e permitem que mesmo no contexto de um time com um nível menor de aculturamento em dados, já seja possível começar a obter valor.
Qual a principal recomendação você daria hoje para uma liderança que deseja movimentar a Transformação Digital em sua empresa?
Existem quatro grandes pilares, e a priorização deles dependerá do momento de cada empresa.
Primeiro, deve haver uma agenda de transformação. Essa agenda é um desdobramento direto da estratégia da companhia. Assim, se a pauta da transformação é o digital, a agenda precisa desdobrar claramente a estratégia da companhia; isso precisa estar muito claro e se refletir em desafios e marcos a serem cumpridos e conectados à árvore de valor da organização. É produtividade da planta? Eficiência do back-office? Adoção de novos canais?
A existência de uma agenda é fundamental para você começar a discutir uma transformação e garantir sua viabilidade por meio de um forte alinhamento estratégico. Então, se o board ainda não fez essa agenda ou não a desdobrou, este é um primeiro importante caminho.
O segundo pilar é a construção de uma boa governança para desdobrar essa agenda em projetos, garantindo que eles tenham escopo e objetivos claros e tracionem. Isso pode ser feito internamente, com o próprio time, ou com uma equipe híbrida, interna e externa. O importante é que as competências necessárias para executar esses projetos sejam identificadas e disponibilizadas na companhia.
A exequibilidade desses projetos é o terceiro pilar desse processo. Se a organização contar com o time interno, naturalmente, essas pessoas precisam estar aculturadas de forma a trabalhar corretamente nas alavancas que vão viabilizar aquele projeto.
Da mesma forma, uma outra alavanca mobilizada deve ser a aquisição de competências no mercado, seja por parcerias com terceiros ou eventualmente por meio de aquisições ou contratação de talentos. Não é incomum que, para viabilizar a estratégia de transformação, as empresas adquiram ou invistam, por exemplo, em startups, para viabilizar essa agenda e internalizar competências que não estavam disponíveis na organização até então.
É inclusive recomendável que a aquisição de pessoal competente seja discutida paralelamente à construção das agendas. Assim, garante-se que a competência estará disponível quando ela for necessária.
A governança garante a cadência e o ritmo acelerado para essa transformação, removendo barreiras e ajustando prioridades ao longo do tempo. Isso é importante porque a estratégia também pode mudar e está em constante renovação.
Por último, mas não menos importante, o quarto pilar envolve a construção de fundações para que a transformação continue mesmo depois da execução de uma primeira agenda transformacional. A transformação não pode ser um “castelo de cartas”. Portanto, essas fundações, compostas por pessoas, tecnologias e dados, precisam ser viáveis. Novamente, o ideal é que a construção da fundação também faça parte da agenda que a empresa está discutindo.
Em suma, estes são os quatro pilares fundamentais: direcionar, governar, acelerar e construir fundações.